América
Cresce dentro das cidades
a carnadura de pó
que suplica tempestades
e
a cabeleira das árvores
que juntas iniciam
a divisão da vida
com seus martelos
que ferem mãos.
Cresce dentro dos corações
a rachadura dos tetos
e dos pulmões
a faina clandestina das manhãs
cresce o barulho de unhas
riscando o chão.
Dentro das cidades e
em cada sobra de luz
sob o arco escuro
o que cresce é
o alvoroço dos dedos
buscando o futuro.
Tudo cresce
e é mar em rebeldia
febre disseminada pelas areias
pele que se descobre tardia
entre rochas e golpes
das ondas frias
o povo
este oceano que não dorme
e nem se desalinha.
O povo cresce
não como menino
contando bolinhas
cresce como edifício
de baixo para cima
como raiz
entre pedras e ervas daninhas.
Eu não poderia dizer
vida
toda ranhura de seus dias
e
suas limas
nas costas do cotidiano
dizer ave sumida
nos ninhos de arame
da América Latina.
Porque cresce dentro das valetas
a espessura do barro
no ferro das picaretas
e
a fúria do galo
no ombro dos operários
levanta o sol na manhã cinzenta
e fala por si
o trabalho das fornalhas
nas arestas deste corte: América.